sábado, 4 de agosto de 2012

Anjos com o canto lírico, nós com o canto do olho.


Encontro-me à espera do sinal que anuncia a autorização para entrar em sala de aula. Sentado em um banco estofado, sozinho, percebo que todos se olham de canto, esperando um virar as costas para ser esfaqueado pela língua. Qualquer movimento brusco é crucial.
Nós, seres humanos, racionais, nos prendendo em padrões, estilos, estereótipos, dentre outras classificações com fins de convencer o próximo de que somos a solução ideal pro elixir de seu ego. Buscamos nas outras pessoas o que queremos encontrar em nós mesmos. Buscamos ser, esquecemos de sermos.
Reparo o complô. Olho para a esquerda e há um grupo composto por duas meninas e um menino, onde ambos atiçam sua mira a laser para um casal apaixonado. Esse mesmo casal, com as mãos atadas, analisam as vestimentas de quem passa pela porta em direção ao corredor. Logo capto olhares direcionados a mim. ''Autista. Sozinho com um caderno, só pode ser autista'', imagino as citações.
O sinal toca. Todos andam enfileirados para sala, intoxicados pelo veneno da convivência, dos preconceitos, das opiniões diversas, das pessoas. A vida é irônica, sarcástica, debochada. Aqui e acolá, os verbetes chicoteiam vidas, cujo julgamento prévio e frágil serve como escudo ou contra-ataque. Mas o engraçado disso tudo é que eu estava ali, quieto, analisando tudo e todos.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012



Recusei o café, e parti. Acho que ao longo da minha vida nunca tinha recusado um café, e vejo que há
sempre uma primeira vez pra tudo. Os compromissos se debateram, e como um bom frouxo, indeciso, e
sem opinião, eu fugi de todos eles. Fiquei atordoado comigo mesmo, me despedi de todos após recusar
o café, e sai com pressa, sem motivo, pois estava fugindo dos compromissos que havia marcado. Juntei
as moedas para pegar o ônibus, ou não, quando fui juntar, me lembrei que não haviam moedas, tive de
caminhar. Comecei a caminhada, coloquei meus fones de ouvido, que me passavam melancolia por
osmose, sem eu perceber, pois já estava melancólico, então os fones só agravaram. Fiquei pensando
no café que recusei, mas o que eu queria mesmo era um cigarro, naquele momento acho que eu daria
meus pulmões em troca de um cigarro, já que sem cigarro, eles não prestavam pra nada. Acelerei o
passo em direção ao meu abrigo, mas sem direção nenhuma, mal sabia por onde andava, porem entrava
nas ruas como se as conhecesse, e tentei convencê-las disso, e espere, acabou a bateria do meu mp4,
e eu só reparei cerca de 10 minutos depois, quando só ouvia minha respiração ofegante que só
aumentara minha vontade de fumar. Dobrei mais várias esquinas, nenhuma que eu conhecesse, todas
desertas, só haviam terrenos abandonados, não havia calçada, e as pessoas que passavam, davam
uma sensação de que eram almas penadas, todas apáticas, sem vida. Para esquecer o que estava ao
meu redor nesse deserto urbano, comecei a narrar, dentro de minha cabeça, o que eu faria ao chegar
em casa, e posso dizer que a narração não teve nenhum nexo, foi mais ou menos "cigarro água água
cigarro chegar pegar fumar beber água e cigarro" estava com uma sensação de abstinência terrível. O
sol era forte, e como estava no "deserto" não podia faltar uma miragem, e foi aí que eu a vi, lá longe,
umas 5 ruas para frente, mas eu poderia enxergar muito bem, era uma bela moça, loira, de cabelos
curtos, com um andar de modelo que estava desfilando, espirrei, olhei e nada vi, realmente acho que era
uma miragem, até agora não sei, mas foi um momento indescritível. Andei por mais de uma hora, quando
cheguei a "highway". Não gosto de estradas, odeio acostamentos, vejo a morte perto a cada carro que
passa, pois sempre ando de costas ao trânsito, para se caso a morte vier, não me pegue de frente.
Achei um cigarro pela metade no chão, e eu tinha um isqueiro, não o peguei, achei que meio cigarro só
iria me deixar com mais vontade de fumar, e 10 passos depois, achei outra metade de um cigarro, tive
de apanhá-lo e voltar para pegar a outra metade. A abstinência havia passado, agora sim eu aceitaria
aquele café. Quando vejo uma placa com uma foto de uma patente, uma xícara de café, e um homem de
boné, que representava um frentista, e em baixo da placa uma observação "300m" isso significa que
estava a 300 metros do paraíso, ou de um posto de gasolina, se bem que meu abrigo fica em frente ao
posto de gasolina, e sempre tomo café nele, então estava sim próximo ao paraíso, foi quando diminui o
passo, e comecei a andar de frente ao trânsito, os carros passavam a mais de 150km/h e todos perto
de mim, mas eu não sentia mais medo, só achava que não era minha hora, e como estava certo disso, podia desafiar a morte. Foi quando comecei a andar e olhos fechados, e já estava aqui escrevendo.

domingo, 6 de novembro de 2011

Notas do transporte.



-Em meio a tantos ratos, com as janelas fechadas, admito sentir medo da leptospirose... A cada flash de luz proveniente dos raios, é a sua imagem que vem à tona. Tenho de admitir que ao seu lado, essa chuva se transformaria em uma ducha, essa gaiola de ratos do esgoto não seria nada mais que uma agradável sauna bacteriana, e todas as outras coisas que agora me afligem se tornariam inócuas!
-O ponto de desembarque se aproxima e se você estivesse lá ele se tornaria meu ponto de paz, de fuga, eu estaria ilhado e alérgico a todo tipo de comunicação com outra espécie que fosse diferente da nossa, ou até mesmo semelhante. Uma espécie nunca extinta, pois seus progenitores acabaram de se encontrar, e talvez por medo nem possam expandi-la.
-Uma coisa tão repentina e quando você vê, o mundo sem sua metade já se tornou obsoleto.
-Por fim, não quero mais atrapalhar/ É preciso acordar do sonho, se não, não teria mais graça sonhar/ A falta de um choque de realidade, seria a realização, mas em tamanha imensidão, a felicidade há de chegar/ Um dia só eu existirei para alguém, da mesma forma que só você existe pra mim, ou todos deixarão de existir para você, isso eu hei de esperar/


?????????????

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Uma carta de mim à mim, para daqui 50 anos.

Lages, 27 de Outubro de 2011

Caro amigo Gabriel,

Estás aí? Espero que sim. Não posso vê-lo, nem senti-lo, mas estou contigo, creia nisso. Estavas com dezessete, mas o tempo passou estilo JK, 50 anos em cinco. Não sei como estás não sei o que pensas, porém lembro-me bem de que seu medo era ser seu próprio desgosto. Sei também que nunca teve medo de arriscar, apenas de dar o ‘’tiro errado’’. Autoconhecimento, não iria te levar ao ‘’topo’’ desejado, já que o limite é o céu, você pararia em Marte, não é?

E trabalhou em quê, durante esse tempo? Fez Ciências Sociais ou História? Seus alargadores, tatuagens, atrapalharam? Teve de deixá-los irem embora com a correnteza do tempo e se rendeu ao ‘’padrão’’? O que eu mais quero, é que leias a esta carta e não veja o que tu eras, no entanto, o que tu és. Problemas vieram, machucaram, entendo, só que as felicidades e bons momentos, são como ‘’tatuagens’’, ficarão ali, eternas na ‘’pele’’ de sua alma.

Seu córtex ainda colabora para uma velha sessão de improviso, na esquina, em uma roda de amigos? Um momento mágico; mítico. E sua dedicação pra música? Largou-a? Impossível. Ela que moldava às beiras, toda essa razão de levar a vida como uma boa trilha sonora, intensa e lírica. Encontrou o amor verdadeiro? Ainda acreditas nele, como Shakespeare, acreditava? Como você acreditava. Como você desejava. É complicado que sua ‘’musa inspiradora’’ música, não tenha ciúmes. Pra provar-me que estás de bem com seu coração, ao ler isso, abrace quem você mais ama e diga que valeu a pena.

Valeu a pena. Improvável citação que arrisco, já que tudo que vier, será um acréscimo a você, ao que você é. E os que se foram? Foram, mas levaram, cada um, um pedaço de ti. O destino é você quem faz. O destino, a vida, é uma redação, onde você escreve, porém a morte decide onde encaixar perfeitamente o ponto final. Nossas decisões foram tomadas corretamente? Cada caminho muda o rumo da história, no entanto, encontram-se no fim. Qualquer decisão tomada será certa, desde que escolhas o que te completa, um límpido acessório espiritual.

Realizou todos os seus sonhos, planos e ideias? Essas perguntas você responde a si mesmo. Bom, desejo que esteja tudo bem contigo. Deu tudo certo? Olhe no espelho. Se te conheço, sei que fez disso tudo uma obra prima. Continuemos brindando e apreciando esta doce aventura chamada vida. Sei que nada é muito e nada é pouco pra ti, no entanto, te satisfazes com o necessário, com o que sabes que és teu.

Um grande abraço, meu eu.